Dossiê: 55º Festival de Brasília, 17º Fest Aruanda e 26º Cine PE

Os três últimos festivais de 2022 aconteceram em um espaço de apenas um mês: o 55º Festival de Brasília foi realizado na capital federal entre os dias 14 e 20 de novembro; em seguida, o 17º Fest Aruanda se deu de 1º a 7 de dezembro, em João Pessoa, na Paraíba; e por fim, o 26º Cine PE encerrou o calendário de 9 a 14 de dezembro.

Os três festivais têm parceria com a Abraccine para a formação do Júri Abraccine e a premiação de longas e curtas. Você pode conferir quais filmes foram os vencedores na página do Prêmio da Crítica em nosso site.

Leia a seguir o dossiê com textos produzidos por associadas e associados da Abraccine sobre filmes exibidos nos festivais aqui citados.

Confira também os textos produzidos por Enoe Lopes Pontes, Pablo Villaça e Ailton Monteiro e publicados em nosso site.

Boa leitura!

55º FESTIVAL DE BRASÍLIA

“Amazônia, a Nova Minamata?” – Divulgação

Amazônia, a Nova Minamata?

“Incansável e surpreendentemente, [Jorge] Bodanzky não veio ao festival exclusivamente para agradecer às homenagens. Ele trouxe embaixo do braço o inédito Amazônia, a nova Minamata? Ou seja, para ele o assunto Amazônia não se esgotou. E nesse ‘não se esgotou’, mais que mera negação gramatical: os anos Bolsonaro deixaram evidente que a transa amazônica não admite guarda baixa. Com sensibilidade impar para o tema, Bodanzky coloca seu filme mais recente na linha de frente para, infelizmente, voltar a um assunto que não se esgotou, redundantemente, em meio século.”
Por Humberto Silva

Canção ao Longe

“Amadurecer, sair da casa dos pais, construir sua própria vida. Passos que são dados de maneira cada vez mais tardia a cada geração. Dirigido pela cineasta mineira Clarissa Campolina, ‘Canção ao longe’ retrata um pouco isso. Através da busca da protagonista Jimena por seu lugar no mundo, dialoga com diversas mulheres de gerações também diversas. Há uma naturalidade em cada cena, no tom das atuações, na maneira como a câmera se aproxima que dá a sensação de estarmos acompanhando a vida real.”
Por Amanda Aouad

Espumas ao Vento

“‘Espumas ao vento’ já se inicia com esse sentimento de perda, de necessidade de reconfiguração. As duas irmãs artistas irão descobrir (ou não) esse caminho durante a narrativa. São como espumas de vento, que podem ser levadas para uma direção qualquer e, repentinamente, serem desfeitas. Incertezas que, até então, alimentavam o setor artístico. É da cultura mais popular e essencial de que o filme fala.”
Por Paulo Henrique Silva

A Filha do Palhaço

“A filha do palhaço é um filme que “funciona” bem no que se propõe. Não é ambicioso do ponto de vista narrativo e almeja sensibilizar o público. Em meu ponto de vista, pode atingir esse objetivo. As relações humanas, pai, mãe, filha, são mais complexas do que o filme apresenta. Mas não é a complexidade humana que Diógenes tem em vista e sim exibir encontros e desencontros entre pai, mãe e filha, com toques de humor e verniz melodramático.”
Por Humberto Silva

A Invenção do Outro

“É, invariavelmente, um olhar do outro. Do homem branco. Mas não é simplesmente um olhar voyeur. É um corpo que se move ao encontro, em busca da troca saudável e ressignificação de si mesmo a partir dessa relação. De fato, uma reinvenção que vai além de simplesmente retratar. As duas horas de projeção da obra se tornam uma imersão sensorial que ecoa nas imagens e sons, nos transes, nos emocionantes reencontros, nas trocas de conversas. É diferente de uma simples observação. Nisso, talvez, esteja o maior mérito do filme. Não tem como não se emocionar com Xuxu ao reencontrar seus irmãos, por exemplo, nos sentimos parte daquilo, já que vínhamos acompanhando sua expectativa.”
Por Amanda Aouad

“Na realização de Invenção do outro, Bruno Jorge segue alguns dos princípios do documentário observacional, conforme a tipologia de Bill Nichols. Não há intervenção da equipe de produção, tampouco controle das imagens colhidas. Com isso, a se imaginar a enorme dificuldade para se filmar em condições difíceis, sob perigo constante, numa floresta hostil à presença humana. Bruno Jorge, a esse respeito, consegue realizar uma proeza épica, que mereceria toda a atenção, mesmo que não fosse surpreendida pela tragédia com a morte de Bruno Pereira. E isso, a tragédia, dá a dimensão do trabalho de Bruno Jorge, cujo filme seria visto tão só como registro etnográfico das condições de vulnerabilidade de povos isolados que vivem na floresta.”
Por Humberto Silva

Mandado

“… a escolha apropriada de depoimentos, além da importância pedagógica, tem uma dimensão didática que muitas vezes não deve ser subestimada num filme que, prescindindo do espetáculo, se sirva como denuncia, alerta. Ocorre que em ‘Mandado’ a discussão jurídica é praticamente coberta pelo relato pessoal de moradores que expressam opinião sobre a medida. Relatos que para o espectador são vagos uma vez que assumem o caráter geral sobre a atuação da polícia na favela e não propriamente sobre o mandato de que o filme se serve de mote.”
Por Humberto Silva

Mato Seco em Chamas

“Se você não entendeu muito da tentativa de resumo de ‘Mato Seco em Chamas’, é isso mesmo. Tal qual as outras obras de Adirley Queirós (‘Branco Sai, Preto Fica’, ‘Era uma Vez Brasília’), ficção científica, futurismo e realidade se misturam em uma linguagem ficcional e documental que nos passam sensações diversas, dialogando com uma sensação de pertencimento e segregação ao mesmo tempo em que traduz muito dos sentimentos das cidades-satélite de Brasília.”
Por Amanda Aouad

“Seguindo a opção que funde ficção e documentário, Adirley exibe personagens reais que ficcionalizam suas próprias experiências de vida. Como esperado, traços do cinema verdade a lá Jean Rouch são percebidos entre as influências de Adirley: os diálogos assumem como característica revelar uma realidade vivida pela exibição do artifício, pelo falseamento; simultaneamente, o falseamento, a encenação, traz à tona a condição de fato em que os três irmãos vivem.”
Por Humberto Silva

Rumo

“A dupla Bruno Victor e Marcus Azevedo toma como cenário principal a Universidade de Brasília, a primeira a adotar a Lei de Cotas no país. Sem precisar de dados para sustentar a necessidade dessas políticas afirmativas, eles recorrem às pessoas que se beneficiaram dessa oportunidade, exibindo histórias de vida emocionantes. A premissa foi se inserir no meio de uma família negra e contar esses desdobramentos de maneira ficcional. O resultado tem momentos irregulares, mas a intenção não deixa de ser louvável.”
Por Paulo Henrique Silva

Utopia Distopia

“O curta se detém nas imagens da cidade em plano aberto com lentes esféricas. [Jorge] Bodanzky filmou a movimentação das pessoas, o tráfico de carros com a câmara em movimento. São imagens que nos dão a ideia de uma cidade com espaços bem amplos e com interação social contida. Não há hoje propriamente destaque e não ser como o Super 8 nos rementem ao sentimento de nostalgia. Imagino o sentido de coletividade em Brasília com o presidente Médici no poder na época mais dura da ditadura.”
Por Humberto Silva

Curtas

“Nossos Passos Seguirão Os Seus…” e “Anticena”, por Humberto Silva

“Calunga Maior” e “Sethico”, por Humberto Silva

17º FEST ARUANDA

“A Espera” – Divulgação

A Espera

“Pela Mostra Competitiva Sob o Céu Nordestino, dedicada aos curtas locais, Ana Célia Gomes trouxe seu singelo ‘A Espera’ (2022), do interior do estado para a capital. Nele, a câmera assume a perspectiva de um dos objetos de afeto da realizadora: os animais. Ativista da causa, Célia passeia pelas ruas de Sumé (PB) para que o espectador acompanhe a saga diária de incontáveis animais abandonados que vagueiam por qualquer cidade brasileira. Com isso, a diretora contempla o olhar dos excluídos, uma tradição forte do cinema nacional, mas com o diferencial que essa parcela específica de excluídos não tem como verbalizar suas dores.”
Por Nayara Reynaud

Déjà Vu

“A sutil complexidade do curta é entregue de maneira orgânica, pois se trata de uma proposta que saiu da mente de Carlos Mosca, que assume várias funções, como roteiro, direção e montagem. Nessa seara, o que se destaca é a função de base do realizador, versado diretor de arte com colaborações com diversos realizadores. Sendo assim, vemos nos cenários e intervenções estéticas mais camadas do discurso do realizador de Campina Grande (PB).”
Por Nayara Reynaud

Lupicínio Rodrigues – Confissões de um Sofredor

“Os focos de ‘Confissões de um Sofredor’ estão na humanização do cantor e compositor, além da pertinência de sua obra nacionalmente. Numa época em que a concentração do eixo Rio-São Paulo era ainda mais exacerbada, Rodrigues conseguiu ter sucesso internacional, mesmo permanecendo a maior parte da sua vida em sua terra natal. A sua vida boêmia de Porto Alegre parece ser o verdadeiro propósito a qual se dedicou, quase como se as canções fossem apenas um subproduto dessa vivência. Na verdade, uma faceta alimentava a outra.”
Por Nayara Reynaud

Propriedade

“‘Propriedade’ é um filme pernambucano e, como tal, marcado por uma forte crítica social, denunciando a opressão nossa de cada dia. Mesmo com esse subtexto político, o longa não abre mão de ser uma peça de entretenimento, lançando mão de todos os recursos que um thriller possui para manter seu público engajado – a começar pelo próprio roteiro, como o cuidado em preservar seus segredos do leitor deste texto denuncia. A dramaturgia não deixa a peteca cair, sempre com novos desdobramentos para manter a história viva e empolgante. Além do ritmo, o roteiro também equilibra bem as forças em choque no conflito. Por vezes, a trama se move por um movimento de engenhosidade da protagonista, enquanto em outros momentos é o outro lado da contenda que faz eclodir novos acontecimentos. Essa trocação franca entre oponentes é a força-motriz do enredo.”
Por Nayara Reynaud

26º CINE PE

“Alexandrina – Um Relâmpago” – Divulgação

Alexandrina – Um Relâmpago

“Força, protesto e resgate. Em onze minutos de ‘Alexandrina – Um Relâmpago’, a diretora Keila Sankofa faz um belo manifesto, no qual a sua protagonista, que dá nome ao filme, ganha uma nova imagem para adentrar na história novamente com toda dignidade e honra que merece. Alexandrina foi uma mulher negra da Amazônia, que esteve presente em diversas expedições no local e conhecia muito sobre a fauna e flora brasileira. A jovem nasceu livre, mas trabalhava fazendo serviços doméstico na Casa Grande. A sua história foi resgatada por um projeto chamado Direito à Memória. Lá, podem ser encontradas mais informações sobre esta mulher tão forte e tantas outras também.”
Por Enoe Lopes Pontes

Benzedeira

“Panorâmicas de uma terra, a voz de uma personagem. Pronto, já estamos imersos no universo de ‘Benzedeira’ em poucos segundos. Com destreza, a obra convida o espectador, já desde o seu início, a mergulhar na rotina silenciosa e tranquila da Benzedeira Maria do Bairro, também conhecida como Manoel Amorim. Para entregar os detalhes tão íntimos, de uma vida pacata, dedicada à natureza e a cura, San Marcelo e Pedro Olaia investigam esse mundo com suas câmeras.”
Por Enoe Lopes Pontes

Casa Izabel

“Explorando os limites entre o realismo, o fantástico e o absurdo, Gil Baroni (‘Alice Júnior’) convoca o espectador a ficar imerso em uma narrativa intensa. Na corda bamba entre empregar organicidade ao exagero e o extrapolar, imprimindo estranhamento, ‘Casa Izabel’ é um tanto irregular em seu teor qualitativo geral. Todavia, este é um longa-metragem que se pauta no risco, seja no conteúdo de sua história ou em sua própria estética. Entre falhas e acertos, o filme é marcado por uma crescente, que vai tornando a sessão mais prazerosa, à medida que a trama avança.”
Por Enoe Lopes Pontes

O Destino da Senhora Adelaide

“É inteligente o caminho que percorre a animação ‘O Destino da Senhora Adelaide’. Em cinco minutos de duração, o público vai descobrindo o que está acontecendo com a protagonista pouco a pouco, bem como quem são as figuras borradas que a cercam O quebra-cabeça é montado, mas as idas e vindas presentes na mente de Adelaide não. O espectador, depois de compreender o que está havendo com ela, passa a ser arrebatado pela delicadeza da direção de Breno Alvarenga e Luiza Garcia.”
Por Enoe Lopes Pontes

Um Outro Francisco

“Existe um lugar destinado para as obras que compõem o cenário da arte erudita, clássica e/ou do cânone. Há um tipo de fotografia que integra este cenário artístico. Mas, fotos vão além disso. Elas também são registros que podem ser pessoais e íntimos ou, após o surgimento das redes sociais, ferramentas de exposição para os próximos ou para quem quiser ver. Explorar os graus dessas separações, os valores das imagens e os olhares possíveis para elas parece ser a missão de Margarita Hernández (‘Uma Nação de Gente’) em seu novo documentário…”
Por Enoe Lopes Pontes

Rama Pankararu

“Mesclando ficção com uma perspectiva do real, ‘Rama Pankararu’ convida o espectador a ficar imerso na realidade dos Pankararu, no sertão de Pernambuco. Com um clima que junta investigação, romance e o desvendar das camadas de suas personagens, o longa-metragem acerta ao conseguir equilibrar os seus elementos discursivos, técnicos e de transmissão das emoções, principalmente pelo tanto de informações que o mesmo traz para a narrativa.”
Por Enoe Lopes Pontes

Último Dia

“Ópera e cultura popular se encontram em ‘Último Dia’, este curta-metragem de doze minutos. Há um bálsamo de criatividade aqui, seja pela junção de contextos culturais ou pela própria direção de Armando Lôbo. É curioso observar também como ele evoca a questão do luto. Sim, há muita informação em cena: três carpideiras, um morto e a própria morte, mobilidade versus uma figura imóvel, canto lírico, bastante movimentação de câmera e um palco de teatro.”
Por Enoe Lopes Pontes

Vermelho Monet

“Para além de tentar forçar uma história de amor e crime – que já não é algo original -, os diálogos são o que mais comprometem a fruição e também o que interfere negativamente nas atuações. Há uma tentativa de pompa, de criar uma ambientação de intelectualidade. No uso desta estratégia, a ligação empática que a plateia poderia criar com a história se quebra. Porque há distanciamento demais quando os sentimentos e sensações das personagens são colocadas em textos que soam como se fossem mais para serem lidos do que falados. O uso da fala não cotidiana poderia ser bem-vinda.”
Por Enoe Lopes Pontes

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