44ª Mostra SP: Os mais comentados

Dias, de Tsai Ming-liang

“Para uns, um deleite cinematográfico, para outros, um teste de paciência. O cinema de Tsai sempre despertou reações nesses extremos, e aqui não seria diferente. É o tipo de filme que dilata o tempo e incorpora essa estratégia em sua narrativa.”
Alysson Oliveira

“Enfim, há um conjunto de situações que transmitem sensações, sentimentos, nos dão tempo de ver até nuvens se deslocando lentamente, e pensar/experimentar o que se vê.  E também o que não se vê.”
Antonio Carlos Egypto

“É o tempo que exaure em Dias, e não suas ideias; dessa forma, o filme apresenta perfeitamente sua proposta imersiva, ao nos mergulhar no moto perpétuo das ações banais do humano, dando peso extra ao minuto, principalmente a quem deseja se livrar deles.”
Francisco Carbone

“O filme não tem legendas e a quase total falta de diálogo parece tornar a história mais íntima. Os gestos rotineiros poderiam ter sido captados em qualquer dia daqueles personagens, porque muito provavelmente eles se repetem, sempre iguais. E os dois são igualmente marcados pela solidão e isolamento.”
Isabel Wittmann

“O crédito disso é totalmente de Ming-liang, que em seus planos extensos (não longos, porque eles têm o tempo que precisam ter para proporcionar suficiente envolvimento do espectador), nos faz absorver todos os detalhes que o seu enquadramento oferece.”
Luiz Joaquim

“A opção, contudo, também gera um efeito amplificador, ao tornar esse silêncio, nunca total, mas completado pelos sons da tranquilidade da natureza ou da agitação urbana, em um elemento universalizante.”
Nayara Reynaud

“Tsai não demonstra pena ou nenhum tipo de compaixão pesarosa por eles, o que não impede o filme de se importar e ser carinhoso com aqueles homens. É nesse equilíbrio de representação emotiva e embalo das vidas vazias que o filme propicia a eles um gesto maior de afago.”
Rafael Carvalho

“Mas tudo isso são reflexões que as imagens nos permitem. Por que Cinema também é isso. Há sutilezas nos não ditos que nos tocam de maneira diversas. A possibilidade de contemplação que o filme de Tsai Ming-liang no dá, nos faz ir além. Nos faz olhar para nós e encarar também nossa própria solidão.”
Amanda Aouad


Isso Não É um Enterro, É uma Ressurreição, de Lemohang Jeremiah Mosese

“O filme é visualmente bem bonito, com efeitos sofisticados e um jogo de luzes e cores fortes muito atraente.”
Antonio Carlos Egypto

“Existe uma circularidade nas ações de passado e futuro que se reflete na casa com parede de terra e pedra, porta vermelha e telhado de palha, de planta também circular. A câmera roda no ambiente captando-o em sua ausência de ângulos e arestas.”
Isabel Wittmann

“A universalidade da questão é banhada pelo registro das particularidades daquela cultura, em particular através da sua musicalidade, seja no instrumento que entroniza as passagens dessa história ou nos cantos entoados pelos aldeões.”
Nayara Reynaud

“A precisão da direção está em captar este clima local com um tom que oscila entre o realista e o onírico, traduzindo uma realidade que tem pontos de contato com todos os lugares do mundo, em que os pequenos e fracos têm suas vidas desfiguradas pelos donos da terra e do poder, mas contam com um repertório infinito de resistência.”
Neusa Barbosa

“Mas há outro fator que torna Isso Não É um Enterro… um filme muito mais preocupado com as agruras internas da personagem do que com uma contextualização objetiva sobre o desalojamento: Mantoa se preocupa com o descanso dos mortos porque ela mesma pressente que seu fim está próximo.”
Rafael Carvalho


Lua Vermelha, de Lois Patiño

“As imagens dos fantasmas nos cenários da natureza também contribuem com o resultado. É o caso de filme que utiliza a singularidade das locações para construir sua trama, a partir da mitologia que o lugar dispõe.”
Ailton Monteiro

Lua Vermelha é um filme de beleza e poesia visual que convida a entrar em seu mundo próprio, onde mito, fantasia e loucura parecem coexistir nas mesmas proporções.”
Alysson Oliveira

“O clima é de poesia e de contemplação. O principal mérito do filme é a beleza plástica da fotografia.”
Antonio Carlos Egypto

“O diretor Lois Patiño é alguém que sabe impressionar com suas imagens que casam a grandiosidade da natureza e a vaziez da morte.”
Cecilia Barroso

“Todo esse esforço de encenação peculiar torna Lua Vermelha uma experiência particular e muito consistente enquanto proposição sensorial, na mesma medida desafiadora na forma como interpela o público e o traz para dentro daquele ambiente maravilhoso e hostil, e também recompensadora para quem se entrega a esse tipo de proposição narrativa”
Rafael Carvalho

“É como se os personagens e o próprio discurso ficassem também imobilizados pelo monstro de um determinismo estético do diretor.”
Nayara Reynaud


Mães de Verdade, de Naomi Kawase

“Ao cinéfilo brasileiro, já acostumado com as tintas novelescas como base de dramaturgia, as pontas são facilmente identificáveis e unidas com certa rapidez, o que também não necessariamente é um problema per se.”
Francisco Carbone

“Ou seja, estamos diante de um puro Kawase, seu universo, sua biografia que se enrosca em vários roteiros. Quanto mais conhecemos seus filmes, mais nos envolvemos com as histórias, que passam a ser também muito próximas de seus espectadores fiéis.”
Ivonete Pinto

“É admirável a forma como, mesmo com um roteiro irregular, o drama dessas mulheres é impresso com eficiência na montagem não linear, que funciona ao entrelaçar as duas histórias.”
Isabel Wittmann

“Trata-se de um melodrama sobre maternidade, porém, desequilibrado entre o seu naturalismo paciente e um drama exacerbado que mais se chocam do que se cruzam nesta história de encontros e desencontros maternos”
Nayara Reynaud

“Kawase extrai intensidade de situações como os encontros dos pais com esta garota, que se darão em dois momentos, para colocar em questão aquilo que realmente lhe interessa – o que é, afinal, a legítima maternidade?”
Neusa Barbosa

“O roteiro consegue até mesmo pregar uma peça no espectador, claramente sugerindo uma composição de personagens frágeis emocionalmente, mas que até o fim da trama revelam-se muito mais maduras e conscientes do seu papel social.”
Rafael Carvalho


Malmkrog, de Cristi Puiu

“Na longa e lenta, mas não desagradável (longe disso!), metragem do filme, somos convidados a refletir sobre a guerra, a morte, Deus, o Cristianismo, o bem e o mal e, no final, até sobre o Anticristo. Por mais que seja uma experiência atordoante acompanhar esse jogo de retórica, não deixa de ser espantoso.”
Ailton Monteiro

“Aqui, ele vai para o extremo oposto – há humor mas não necessariamente dentro do filme e sim vindo de pensamentos e ideias, algumas vezes ridículas, que os personagens externam. Assim, a urgência se dissipa, numa narrativa enclausurada (mas não claustrofóbica) de mais de 3 horas, com seu tempo próprio.”
Alysson Oliveira

“Seguir os raciocínios dos personagens equivale, com o perdão da heresia, a fazer a via dolorosa de Cristo. A literatura eclesiástica é parte das conversas travadas pelos personagens, onde a luta do bem contra o mal rende longas reflexões.”
Ivonete Pinto

“Esse banquete filosófico nem sempre é digerível na verborragia do rebuscado texto que a situação exige, com o espectador, provavelmente, se atentando mais às discussões que lhe são mais interessantes, do ponto de vista pessoal de cada um.”
Nayara Reynaud

“Parece mesmo uma peça que o diretor prega no espectador, bastante bem exemplificada por uma situação que toma de assalto a trama no meio do filme, causa um surpreendente abalo, mas que depois é simplesmente ignorada e esquecida.”
Rafael Carvalho


Miss Marx, de Susanna Nicchiarelli

“Talvez tenha faltado mais emoção ao abordar as paixões de Eleanor, tanto pelo companheiro quanto por seus ideais herdados do pai e trazidos para o feminismo, mas ainda assim é um filme bem digno e bonito”
Ailton Monteiro

“Com inventividade, a diretora Susanna Nicchiarelli imprime um vigor muito próprio na narrativa e o punk serve perfeitamente para dialogar com a trajetória da retratada.”
Isabel Wittmann

“Em Miss Marx, são imagens poderosas que cortam a ficção. Tão poderosas que deixam o tema do feminismo em segundo plano às vezes. Mas seria uma falsa leitura, já que são temas interligados até a medula.”
Ivonete Pinto

“Isso não faz de Miss Marx uma produção ruim, mas a sensação de impotência da protagonista inunda o filme que não consegue revelar a Eleanor por trás da imagem de filha e esposa”
Nayara Reynaud

“É difícil ter uma ideia precisa do espaço intelectual ocupado por ela em seu tempo quando a diretora a coloca falando trechos de seus textos para a câmera, um recurso um tanto artificial.”
Neusa Barbosa

“Ou seja, o filme planta os debates políticos que constituem o pensamento combativo da filha de Karl Marx, mas não busca colher os frutos desses embates frontalmente. Resta apenas expurgar os demônios dançando ao som de música alta numa casa fechada, longe da vista de todos.”
Rafael Carvalho


Nova Ordem, de Michel Franco

“O filme tem sequências fortes e violência, mas não se compraz em explorar isso comercialmente.  É até moderado no uso dessa violência, necessária de ser mostrada, em função do que se quer expor, revelar e provocar reflexões.”
Antonio Carlos Egypto

“Em tese, é um argumento ousado que poderia ser defendido para olhar todos os lados do leque, mas ao escolher o que não tratar no plano narrativo, Franco toma o partido que acha que não estava tomando.”
Francisco Carbone

“A esperança está morta para uma população que acredita ter se insurgido contra um sistema que a oprime, sem ter a menor ideia do que está colocando em seu lugar. É o fim.”
Luiz Joaquim

“Soma-se a isso um roteiro de arquétipos, sem desenvolvimento dos personagens, que faz com que determinadas atitudes venham sem contexto, dependendo do entendimento do espectador para compreender, mas que podem ser facilmente mal interpretadas.”
Nayara Reynaud

“O que se vê em curso em Nova Ordem não é uma revolta popular sem direção nem líderes. Há, por trás dela, um processo de instrumentalização dessa histórica raiva contida e de instalação do fascismo, numa tomada de poder militarizada e brutal. Por isso o filme, em seus extremos, se mostra verdadeiramente assustador.”
Neusa Barbosa

“Franco acaba por exercitar o que sabe e se regozija fazendo de melhor: seu cinema de crueldades e sem concessões, com aquele comichãozinho louco de assumir o posto maior de enfant terrible e cineasta provocador high top do circuito de festivais de arte.”
Rafael Carvalho


Sibéria, de Abel Ferrara

“Afinal, o diretor, por mais que aparentemente tenha deixado as drogas, aqui opta por uma experiência muito parecida com uma bad trip ou algo parecido. Estamos em um território onde o espaço e o tempo são confusos como em um pesadelo ou um sonho desconfortável.”
Ailton Monteiro

“A narrativa é fragmentada, estranha, lúdica até, pedindo do espectador envolvimento com as sensações e com o caráter plástico das imagens.”
Antonio Carlos Egypto

“Tudo isso é permeado por uma misoginia casual nada velada e uma forte marcação do male gaze. Ao tentar explorar os sonhos de seu protagonista, Ferrara falha em conseguir dar corpo à narrativa em Sibéria, que acaba por apenas externar imageticamente seu olhar pouco acolhedor no que tange a gênero.”
Isabel Wittmann

“Começa, então, uma viagem onírica pela mente de Clint que, ao mesmo tempo em que busca um sentido psicanalítico, pede ao espectador que se desprenda da razão.”
Nayara Reynaud

“Talvez por essas múltiplas camadas que o ator imprime a todas as suas interpretações e pela riqueza visual que emoldura a trajetória de Clint, o filme ganha uma certa permanência em nossas retinas, em nossa pele.”
Neusa Barbosa

“Demora um pouquinho pra gente entender que Sibéria propõe uma viagem muito louca pela psique humana, os traumas do passado e os demônios incansáveis digladiando-se no inconsciente que o personagem de Willem Dafoe acessa por algum motivo não explicado.”
Rafael Carvalho

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