Seminário promovido durante o Festival de Gramado discutiu a censura no caso A Serbian Film

Por Ivonete Pinto

Na tarde deste sábado, 06/08/2011, no 39° Festival de Cinema de Gramado, a Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, em promoção com a ACCIRS – Associação de Críticos de Cinema do RS, realizou o seminário A censura voltou? O veto ao longa ‘A Serbian Film’ em questão”.

O evento aconteceu no dia posterior à classificação oficial do filme para 18 anos. A classificação foi assinada por um dos participantes da mesa, Davi Pires, diretor do Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação do Ministério da Justiça. Pires fez a participação mais aguardada do seminário, justamente porque seria a oportunidade de se ouvir sobre os critérios que levam à classificação etária dos filmes.

O mediador da mesa, Roger Lerina, presidente da ACCIRS, fez um resumo do processo de censura pela qual A Serbian Film passou, iniciando com o pedido do DEM fluminense para proibir a exibição no Rio Janeiro e culminando com a intervenção do Ministério Público de Minas Gerais, que solicitou a interdição em todo território nacional.

Antes dele falou o diretor do FANTASPOA – Festival de Cinema Fantástico de Porto Alegre, João Pedro Fleck, que exibiu A Serbian Film. Fleck explicou que a versão mostrada possuía 3’30 de cortes porque a exibição foi resultado de acordo com o distribuidor internacional do filme, a Jinga Films, da Inglaterra. Segundo Fleck, estes cortes tiveram a função de suavizar algumas cenas. De todo modo, ele defende que não se trata de uma obra com grandes méritos artísticos: “É um filme de terror como tantos outros”.

Frederico Machado, diretor da Lume Filmes e do Festival Internacional Lume de Cinema, de São Luis do Maranhão, o segundo festival a exibir o filme no Brasil, corroborou as palavras de Fleck e cobrou do representante do Ministério da Justiça critérios mais claros de classificação de filmes. Citou o exemplo de Lola, de Brillante Mendoza, que foi classificado como “filme de assassinato”: “Me parece que não viram o filme no Ministério”, ironizou Machado.

Luiz Zanin Oricchio, presidente da Abraccine, lembrou que a ação da Justiça pegou a todos de surpresa, porque havia o entendimento de que estes eram fatos ligados apenas ao nosso passado. Alertou, que, embora a Constituição de 1988 assegure a liberdade de expressão, apareceu agora uma “censura que não ousa dizer seu nome”. Para Zanin, o fato pode gerar um precedente perigoso justamente porque não pode ser nomeado como “censura”. Por fim, defendeu que a sociedade não pode ser tutelada.

O último a falar, Davi Pires, iniciou sua participação afirmando que é muito comum que as pessoas confundam conceitos de “censura” e de “classificação”, e que é preciso, antes de mais nada, sabermos o que está sendo dito. Sustentou que o exercício da democracia é um exercício de direito e quem se sente ofendido por esta ação do Ministério Público deve e tem por onde buscar a reversão da decisão.

Pires admitiu que muitos envolvidos no veto ao filme de fato não o tinham visto, mas advertiu que existe um outro tipo de censura, que é a exercida pelo próprio mercado: “Na Inglaterra, por exemplo, país liberal, o filme recebeu vários cortes. O distribuidor, neste caso, entendeu que deveria fazer os cortes para ter seu produto melhor aceito”, disse Pires.

O diretor do Ministério da Justiça citou também um exemplo em torno da classificação das novelas de televisão, que também passam pelo seu departamento, trazendo o exemplo do beijo gay. Segundo ele, os autores das novelas costumam dizer que não exibem o beijo em função da classificação indicativa: “A culpa é jogada na nossa conta, mas o fato é que agora, a partir de pesquisas realizadas sobre o tema específico, sabemos que é o mercado, ou seja, o telespectador, quem não quer ver beijo gay em novelas”, sustenta.

Sempre afirmando que o cidadão deve buscar seus direitos pela via institucional, Davi Pires esclareceu quanto aos critérios adotados pelo Ministério da Justiça, implantados após intensas discussões com a sociedade, onde participaram representantes de entidades como o Conselhos Federais de Psicologia e de Pediatria, além de representantes do Conan – Conselho Nacional de Auto-Regulamentação e Normalização e do Ministério Público. Esses critérios, que estão disponíveis no site do Ministério da Justiça, tratam da classificação indicativa a partir de três grandes temas: cenas de sexo, cenas de violência e uso de drogas.

Pires também esclareceu que o Ministério Público de Minas Gerais solicitou a proibição do filme, mas na verdade o Ministério da Justiça não tem o poder de proibir nenhuma obra, apenas de classificar. Com a decisão, que deve ser publicada no Diário Oficial da União nesta segunda-feira, A Serbian Film, então, estará “não recomendado para menores de 18 anos por exibir cenas de sexo e violência extrema, além de cenas de pedofilia”. Pires ressaltou que a decisão que leva sua assinatura levou mais tempo do que o normal (os filmes levam 20 dias no máximo para receber a classificação) porque foi encaminhado antes à consultoria jurídica do próprio ministério, que orientou a decisão final. No entanto, a decisão circunscrita ao estado do Rio de Janeiro permanece, estando o filme proibido naquele estado.

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